quinta-feira, 8 de outubro de 2020

DENÚNCIA DA ABRAPO/RO SOBRE AS VIOLÊNCIAS SOFRIDAS PELO ACAMPAMENTO TIAGO SANTOS

RONDÔNIA PREPARA PARA REPETIR O MASSACRE DE CORUMBIARA 

A Associação Brasileira dos Advogados do Povo – ABRAPO, Subseção Rondônia, diante das “Fake News” publicadas desde o dia 03 de outubro de 2020, exaustivamente repetidas em rede nacional, produzidas a partir do  assassinato do Tenente da Reserva José Figueiredo Sobrinho, atribuída aos sem terras do Acampamento Tiago dos Santos, nos cumpre trazer informações colhidas junto aos camponeses e ao devido processo legal. 

O Acampamento Tiago dos Santos está localizado nas fazendas NorBrasil e Arco-Iris, em Nova Mutum,  Distrito de Porto Velho/RO, faz parte de um grande latifúndio de mais de 57 mil hectares, cujo suposto  proprietário seria a empresa Leme Empreendimentos Ltda, de propriedade de Antônio Martins (Galo Velho). 

Essa área teve uma ação de reintegração de posse encerrada em 2017 (autos: 0012311.86.2014.4.01.4100 e  0003261-31.2017.4.01.4100 – 5ª Vara Federal do TRF1), processo devidamente arquivado e que prova que se  trata de área de conflitos agrários desde o ano de 2014, cuja origem dominial não foi esclarecida e frente ao  histórico do Galo Velho no Estado de Rondônia pode se tratar de área pública grilada. 

Galo Velho (Antônio Martins), utilizando de empresas, como a Leme Empreendimentos, tem um histórico de  grilagem de terras no Estado de Rondônia, constando na CPI da grilagem como grileiro do Lote São Sebastião,  localizado em Porto Velho/RO, num total de 83.221 hectares de terras (fls. 361 do Relatório da CPI destinada a  investigar a ocupação de Terras Públicas na Região Amazônica – 2001), entre outras grilagens devidamente  comprovadas como as terras da região de Cujubim, onde hoje é o Assentamento Sol Nascente. 

Em 23 de julho de 2020, através da Operação da PF: “Operação Amicus Regem cumpriu mandados de busca  e apreensão em endereços de investigados em Porto Velho (RO), Brasília (DF), Cuiabá (MT), São Paulo e  Itaituba (PA) em busca de provas e bens de interesse das investigações contra empresários, advogados,  servidores públicos e empresas envolvidas na formação de uma organização criminosa (orcrim) que conseguiu  lucrar mais de R$ 330 milhões por meio grilagem de terras e fraudes no estado de Rondônia ocorridas entre  2011 e 2015. (...) orcrim seria liderada por Antônio Martins o Galo Velho, auxiliado pelo irmão dele, o  advogado Sebastião Martins, pelo sócio Dorival Baggio e por seu filho José Carlos Gouveia Alves (também  conhecido por José Carlos Gouveia Martins dos Santos). Além deles, havia a participação do então juiz  federal Herculano Martins Nacif, do servidor da Justiça Federal Everton Gomes Teixeira e do perito judicial  nomeado Paulo César de Oliveira, os quais praticariam atos para favorecer o grupo de Antônio Martins em  processos de desapropriação.” (disponível http://www.folharondoniense.com.br/geral/antonio-martins-o-galo velho-e-um-dos-alvos-da-operacao-da-policia-federal/. Acessado em 12/08/2020). O que reforça o caráter de  grilagem de terras públicas com a conivência do Estado que esse senhor vem praticando há anos no Estado. 

Isso demonstra que o Galo Velho não é fazendeiro ou proprietário de terras, mas sim, grileiro, organizado em  quadrilha com a participação até mesmo de funcionários do Estado. Fato amplamente divulgado, reforçando a  relação entre Galo Velho e Estado. As grilagens de terras só são possíveis com apoio do aparato repressor do  Estado e parece que essa proteção o Galo Velho tem recebido até então, mesmo com uma operação policial dessa  envergadura não foi ainda possível restituir as terras griladas pelo Galo Velho ao patrimônio da União. 

A ocupação do imóvel pelas famílias camponesas do Acampamento Tiago dos Santos1foi realizada em 22 de  junho de 2020, num processo de pressionar o INCRA a resolver a situação do imóvel e dar ao mesmo a destinação  correta. O imóvel possui uma área de mais de 57 mil hectares, tem mais de 600 famílias no imóvel. Há uma vida  social e coletiva estruturada, que compreende espaço de estudo para as crianças, farmácia com atendimento  básico, cozinha coletiva, espaço da igreja e organicidade interna para garantir que não entre armas, drogas e  bebidas no Acampamento, permitindo a valorização das famílias que realmente querem terra para produzir. 

No dia 24/07/2020 protocolamos requerimento no INCRA/SR-17 solicitando acesso e cópia dos processos  administrativos das fazendas para verificar a cadeia dominial da mesma e sua origem. Até o presente momento o  INCRA não entregou e nem permitiu o acesso, se negando as dar as informações necessárias sobre o imóvel.  (Processo administrativo n. 54.300.000774/2013-16). 

No dia 03 de outubro de 2020 é assassinado perto do Acampamento Tiago dos Santos o policial da reserva:  Tenente da Reserva José Figueiredo Sobrinho, no que passaram a acusar os camponeses (sem terras), sem  qualquer prova concreta, de o terem executado. Nessa noite mesmo, o referido Acampamento foi cercado pela  

  

1 Tiago dos Santos foi um dos camponeses assassinados pelo PM em 2018 na região onde se encontra o Acampamento 2 Amigos,  acampamento vizinho ao Acampamento Tiago, portanto, área do conflito atual (https://mst.org.br/2018/08/02/cpt-de-rondonia-repudia morte-de-trabalhadores-rurais-e-policial).

PM, que efetuou diversos disparos de arma de fogo contra o acampamento, que resultou em mais um policial assassinado: Sargento Rodrigues da Força Tática do 5º Batalhão da PM. Por fim, os corpos só são retirados no  dia 04 de outubro de 2020. 

No dia 04 de outubro de 2020, utilizando-se de helicóptero, a PM dispara contra camponeses que estavam  perto do Acampamento, inclusive, vindo a atingir a moto de um pai de família que estava com sua esposa e filho  no veículo, tendo sofrido somente algumas escoriações. Os camponeses se protegem e o isolamento do  Acampamento é feito. 

A partir daí começa a saga de horrores promovida pela imprensa comprometida com o Estado e com esse  Governo Fascista que não respeita os direitos do povo e nem o processo legal, acusando os camponeses de serem  “terroristas”, de promover “invasão” de terras e todas as mazelas que claramente sabemos que o Capitalismo  produz e o latifundiário é a expressão concreta dessa política. 

Por tudo isso já relatado, o que está acontecendo, concretamente, é a criminalização dos camponeses com o  acirramento do conflito, uma vez que, tanto as policias, quanto os jagunços dos fazendeiros e participantes de  organizações criminosas, agem como se os verdadeiros culpados fossem os camponeses. Não há  comprometimento com a verdade real, mas sim ação oportunista para perseguir os camponeses e ao mesmo  tempo, facilitar a grilagem.  

Não há questionamento sobre o motivo do policial da reserva estar na área de conflito, pois, a alegação de que  estaria pescando é muito pueril, já que os conflitos agrários sempre foram públicos e notórios na região, inclusive,  o próprio grileiro havia ingressado com pedido de reintegração de posse e estava forçando a concessão de uma  liminar: (Autos: 7030469-20.2020.822.0001- 7ª Vara Cível da Comarca de Porto Velho/RO), sendo que após o  assassinato do PM, o advogado do Galo Velho, no dia 05/10/2020, fez juntada de matérias jornalísticas  sensacionalistas nos autos e petição para comover o juiz a conceder liminar de reintegração de posse, já  determinando que as mortes teriam sido ocasionadas pelos camponeses e que a liminar deveria ser concedida  com urgência. Nessa linha criminalizadora há discursos inflamados de autoridades policiais e políticas, inclusive  com pedido ao Governo Federal de uma GLO para os camponeses (https://www.tudorondonia.com/noticias/marcos-rogerio-solicita-apoio-do-ministerio-da-justica-para 

solucionar-conflitos-agrarios-em-rondonia,57512.shtml, Acessado em 07/10/2020). 

Enquanto isso os Camponeses relatam que o PM da Reserva sempre fazia serviços de pistolagem para o Galo  Velho na região, fato que deveria ser devidamente investigado pelos órgãos de Segurança, inclusive, apurar a  responsabilidade do Galo Velho nesse assassinato. 

Concretamente o Galo Velho está repetindo um “roteiro” realizado em 2004 no auge do processo de  reintegração de posse do Acampamento Sol Nascente, na região de Cujubim; quando esteve envolvido no  assassinato de um caseiro de sua propriedade e acusou camponeses, que responderam processo criminal e foi  constatado no final que estes não eram responsáveis pelo crime. 

Outro fato narrado pelos camponeses do Acampamento Tiago é a ação da PM que utilizando de helicóptero  tem efetuado disparo de armas de fogos contra qualquer pessoa que esteja próxima do acampamento, havendo  uma verdadeira trincheira impedindo a entrada e saída de camponeses da região.

(Trecho do jornal de 2004) 

Agora a tarde, dia 08 de outubro de 2020, os camponeses descreveram o cerco policial que estão sofrendo,  sendo impedido de entrar comida e leite no acampamento, estando as crianças sem o leite desde segunda-feira  (05/10/2020), pois, qualquer um que sai ou tente entrar no Acampamento é recebido com tiro pela PM. Essa  operação da polícia, com mais de 290 policiais, está devidamente divulgada na mídia  (https://ariquemes190.com.br/noticia.php?id=57169 Acessado no dia 08/10/2020). O que não contam é as  condições em que estão colocando os camponeses do Acampamento Tiago dos Santos: cerco de guerra com  previsões catastróficas. Vimos isso acontecer em 2016 no Acampamento Enilson Ribeiro, em Seringueiras,  quando um grande cerco policial foi armado contra os camponeses que ocuparam A fazenda Bom Futuro, que  veio a ser provado depois ser terra pública do INCRA. (https://maoistroad.blogspot.com/2016/07/brasil latifundiarios-preparam-ataques.html. Acessado em 08/10/2020). 

Lamentável que a história se repita e esse grileiro continue usando as mesmas táticas de acusar camponeses  de assassinatos e mais ainda que a mídia se some nessa difamação.

O Conselho Estadual de Direitos Humanos e o Conselho de Direitos Humanos da OAB foram acionados pelo  Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos – CEBRASPO/RO, no que aguardamos uma manifestação dos  mesmos e o devido acompanhamento as violações de direitos humanos apontadas. 

A Secretaria Estadual de Segurança Pública já declarou “guerra” aos camponeses, não se preocupando em  investigar a situação concreta sobre os assassinatos dos policiais militares. Esperamos o pior em desfavor dos  camponeses que lutam por um pedaço de terra e agora estão marcados para morrerem. 

A responsabilidade será única e exclusivamente do INCRA, Galo Velho e Estado por qualquer coisa que vier  a acontecer com esses camponeses. Inadmissível que num Estado Democrático de Direito se promova divulgação  e incentivo a grilagem, pistolagem e extermínio de camponeses. 

Estamos acompanhando a situação dos camponeses do Acampamento Tiago dos Santos e aguardamos que  providências sejam tomadas para evitar um novo “MASSACRE DE CORUMBIARA”. 

Para qualquer informação, carta de solidariedade ou contribuições podem entrar em contato conosco pelo  email: abrapojiparana@gmail.com 

Ji-Paraná/RO, 08 de outubro de 2020. 

ABRAPO/RO

 

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